terça-feira, 8 de julho de 2014

Fanicos e farfalhas

Jorge Adelar Finatto
 
photo de joaninha: Wikipédia. Autor: Jon Sullivan (PD-PDphoto.org]


Quem viu alguma vez uma joaninha caminhando na página de um livro ou sobre uma folha verde sabe do que estou falando.

É talvez o acontecimento mais importante do universo.

Nenhuma literatura e nenhuma filosofia do mundo valem os passos da joaninha.

Só que pouca gente percebe o engenho e a arte por trás da construção da frágil joaninha.

Existem muitos outros assuntos importantes para se tratar, está bem. Um blog a sério não devia ignorar isso. Tudo bem.
 
O fato, contudo, é que me encanto com os farelos do mundo, com a coisa pouca ou nenhuma que somos, como um raio de sol na janela ou caído dentro de um copo dágua sobre a mesa.
 
As coisas pequenas me atraem, me cativam, me elevam. As outras me enfadam, quando não revoltam.

Encontro beleza e claridade nos fanicos da existência.

Tudo que é breve e pequeno se parece com ser humano e com estar vivo e ser transitório, e isso me interessa sobretudo.

Os verdadeiros e últimos sentidos habitam além das aparências, é assim que eu vejo. E o que eu mais enxergo, quando penso profundamente na vida, é a pequenina joaninha. Talvez tudo isso não passe de mais um dos meus notórios enganos.
 
O mundo silencioso das migalhas me é, por isso, muito caro e diz muito mais sobre o que nós somos - ou o que sou eu, ao menos - do que um tratado ontológico.
 
Quando se perde a palavra, é como se perdêssemos a vida. Deus nos livre e guarde.
 
Na arte, ao menos, podemos voar, sonhar um pouco, levitar acima dos mausoléus e crematórios existenciais.

Mas sei também que ninguém pode viver entre as nuvens.

Deve haver um caminho de passagem entre as farfalhas da existência e a copa das estrelas; entre a imensidão da Via Láctea e os passos humildes e comoventes da joaninha.

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Texto revisto, publicado antes em 25/11/2012.