segunda-feira, 12 de setembro de 2011

O homem que roubou o sol

Jorge Adelar Finatto


pintura: Maria Machiavelli
 

Um homem de coração triste pode entristecer a vida de muita gente.

O sol está preso no sótão da casa do homem sem esperança.

Em uma manhã de infinita tristeza, ele ergueu os braços, apanhou o sol com as duas mãos, como se fosse uma laranja, e o levou para o trevoso lugar. Desde então, não mais o devolveu para a rua onde mora.

- Nunca, nunca mais vou soltar o sol -, disse a um grupo de meninos e meninas que foram até a frente de sua porta. 

- Ninguém mais vai ver a luz nem receber calor nessa rua.

À noite, os vizinhos observam a estranha claridade que escapa pela claraboia. Raios iridescentes giram entre si, perpassam o espaço e vão em direção ao vazio universo. Nenhum, no entanto, fica para iluminar aquele pequeno lugar mergulhado na sombra.

O homem triste tem uma pedra enorme, pesada e fria, no coração. Uma lápide com uma inscrição numa estranha língua que ninguém entende. Não consegue mais falar nem sentir.

O roubo do sol foi um ato de desespero, de revolta com coisas más que aconteceram na sua vida. Ao agir dessa maneira, privou a rua e seus habitantes de luz, alegria e esperança.

É preciso trazer de volta o homem triste para o convívio, antes que tudo em volta dele congele, antes que as seivas sequem, antes que desapareça a vida naquela rua.

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Maria Machiavelli é artista plástica em Passo dos Ausentes onde mantém ateliê e nele ensina gratuitamente técnicas de pintura.